FAZ-ME FALTA

Acordo e dirijo-me à sala
onde o sol adentra pelas portadas da varanda
está um lindo dia de sol primaveril
que nos adoça a alma.
Abro as portadas e espreito

Estranhamente, não se vê
o vai e vem das pessoas
que descem a rua para ir à eucaristia dominical
ou que vão à padaria da esquina.

Tudo está calmo….
esporadicamente vê-se alguém
passeando o seu animal de estimação.

Fico inquieta...
esta não é a minha rua, não é o meu tempo
dá-me vontade de sair, de correr

Sinto falta do cumprimento de mão ao vizinho
do abraço daquela pessoa
que já não via à algum tempo
Sinto falta dos beijinhos dos amigos

Sinto falta de ouvir o meu neto dizer:
"anda fazer uma corrida comigo vovó"!
e eu a dizer: "não posso meu amor dói-me o joelho"
como eu preferia que me doesse o joelho
e poder ir atrás dele.

Faz-me falta a liberdade, sinto-me fechada
 numa espécie de gaiola dourada.
O que me espera? o que nos espera?

Tenho esperança que tudo vai ficar bem
mas dói esta espera, e como dói!

Entretanto, vou conversando com as minhas plantas
que esperam sossegadas no canto da varanda
enquanto eu…
Olho o horizonte..

FERNANDA CABRAL
28/03/2020   (Sobre o Covidis 19)

O COMBOIO PASSOU

A paisagem verdejante ficou para trás
úú úúúú pouca terra, pouca terra, pouca terra
A máquina de ferro correndo contra o tempo
entra na cidade, rugindo, bramindo
deitando fogo pelas ventas
até… que lentamente pára
para os viajantes se apearem.
O enorme depósito de água da estação
serve para lhe mitigar a sede
causada pelo desgaste dos kilómetros percorridos.
O fogueiro aconchega-lhe as entranhas com o carvão
preparando-a para uma nova viagem.
Os passageiros sobem,
acomodam-se nos bancos de madeira
olhando de soslaio os companheiros
e entregam- se ao balancear ritmado
do comboio em andamento.
Uns colocam a conversa em dia
outros vão dormitando,
outros vão apreciando a paisagem
enquanto aguardam a paragem
no seu destino.
úú úú pouca terra, pouca terra pouca terra…
O comboio acabou de passar na minha cidade.

FERNANDA CABRAL

20/01/2020